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The office of Speaker of the US House of Representatives is hereby declared vacant.

A partir do momento em que Kevin McCarthy chegou a um acordo, com ajuda dos democratas, para evitar um shutdown do governo, o seu trabalho como Speaker da Câmara de Representantes dos EUA estava em perigo. Depois de muitos avisos de que o faria, foi Matt Gaetz, da Flórida, quem forçou uma votação sobre a matéria.

A maioria dos republicanos da Câmara apoiou McCarthy, mas 8 dos mais radicais do partido juntaram-se aos democratas numa votação histórica para o expulsar. McCarthy não se arrepende de ter fechado o acordo que manteve o governo operacional, embora isso tenha significado o início do fim do seu mandato.

“I was raised to solve problems, not create them. So I may have lost the vote today, but as I walk out of this chamber I feel fortunate to have served the American people. Unfortunately 4% of our conference conjoin all the democrats, and dictate who’s gonna be the republican speaker of this house. I don’t think that rule is good for the institution, but apparently I’m the only one.”

Isto é algo que nunca aconteceu antes na história da política americana, a última vez que foi feito um esforço para destituir o Speaker foi em 1910 e a tentativa falhou. Desta vez, sucedeu, é um grande momento na política americana que chega numa altura em que há 2 questões críticas a manter o governo em funcionamento e a garantir financiamento a longo prazo à Ucrânia. São duas questões que precisam de resposta rápida.

Não fico surpreendido que a moção para o retirar tenha avançado, fico surpreendido que tenha avançado sem nenhum plano aparente de McCarthy de como superá-la, ou até de procurar algum apoio dos democratas para manter o seu emprego. Aconteceu muito de repente, mas estava em cima da mesa desde o início do ano que em algum momento haveria um desafio à sua liderança. Estava, aliás, escrito no acordo que o levou a conseguir o cargo em primeiro lugar: foram necessárias 15 rondas de votação (uma forma bastante humilhante), para conseguir o cargo, e uma das concessões que fez foi a de que qualquer um poderia apresentar tal moção para destituí-lo a qualquer momento. Então quando se tem um um grupo determinado de destruidores à direita do próprio partido, temia-se que a alguma altura isto acontecesse. E após ter trabalhado com os democratas para garantir um acordo provisório para manter o governo em funcionamento, aconteceu.

Evitou-se, por pouco, um shutdown do governo, e foi evitado mantendo o governo em funcionamento por mais 45 dias, portanto numa questão de apenas algumas semanas, teremos exatamente o mesmo problema que o Congresso enfrenta, sobre se conseguirão manter as coisas a trabalhar a longo prazo. Essa será a questão premente que quem quer que seja eleito o novo Speaker terá de enfrentar, e há alguma urgência nisso, porque está ligado à questão da Ucrânia. Uma forma de fazer esse acordo foi mantendo de fora a questão controversa do financiamento para a Ucrânia, sendo o objetivo tratar disso separadamente, mas agora também essa questão ficou refém desta confusão toda.

Em primeiro lugar, terá de se eleger um novo Speaker, o que congela os trabalhos da Câmara até que um novo Speaker seja nomeado. Tudo se torna mais difícil, incluindo o financiamento da Ucrânia, que será uma tarefa urgente para o próximo líder da Câmara dos Representantes. Há uma maioria na Câmara e no Senado para apoiar a Ucrânia. No entanto, conseguir que a vontade dessa maioria sobressaia sobre uma bancada republicana muito dividida na Câmara (alguns republicanos são pró-russos) não vai ser nada fácil, e está tudo agora dependente das negociações sobre o papel do Speaker. Felizmente, a maioria da opinião pública americana está do lado da Ucrânia.

Parece que os republicanos, na sua reunião de dia 10 de outubro, irão discutir quem poderá ser o próximo orador: haverá muito lobbying e depois uma votação. Há alguns candidatos a serem mencionados mas não é claro quem sairia por cima, porque, seja quem for, terá de conseguir superar estas divisões dentro dos republicanos, que têm estado tão claras e à vista de todos nos últimos dias. Um dos nomes é Steve Scalise, 2º na linha de chefia dos republicanos na Câmara e Líder da Maioria, mas foi recentemente diagnosticado com cancro, o que se torna uma complicação para ele. Jim Jordan, o chairman da House Judiciary Committee, e que lidera as investigações sobre Joe Biden, tem credibilidade junto do partido como antigo presidente do Freedom Caucus, mas também conseguiu trabalhar de forma construtiva com os aliados de McCarthy. Ainda existem outros, mas ainda será muito difícil como foi da última vez, e provavelmente será ainda mais difícil fazer com que os republicanos concordem em torno disso.

McCarthy claramente não tinha amigos suficientes no final das contas. Conseguiu antagonizar pessoas de ambos os lados de uma forma que acabou por acontecer com ele. Ele também conseguiu, às vezes de forma bastante inesperada, manter os trabalhos a funcionar, conseguiu fazer acordos para aumentar o teto da dívida e conseguiu fazer um acordo temporário para manter o governo a funcionar. No final, ao sair do cargo, disse que colocou a governação acima do protesto. Pode haver algum crédito dado a McCarthy, pois em momentos críticos conseguiu manter tudo funcional em Washington, não é um trabalho fácil de fazer, e quem vier depois dele enfrentará as mesmas dinâmicas e as mesmas divisões dentro do partido.

Os democratas poderiam ter salvado McCarthy e optaram não o fazer: estrategicamente bem jogado não o terem feito, porque McCarthy falhou em todas as promessas que fez ao Partido Democrata. Um Speaker destrutivo para os democratas, pôs em causa a eleição de Biden, era absolutamente irresponsável e conseguiu culpar os democratas por um quasi-shutdown que só tem culpa do Partido Republicano. Os democratas acharam que McCarthy era uma pessoa de má fé e não o quiseram ajudar a salvar-se. O Speaker até podia ter negociado com os democratas e disse expressamente que não o queria fazer. Teve assim, a sua queda.

Há uma forte possibilidade de que isto tenha estabelecido um precedente perigoso. Se queremos ver estabilidade, então uma das questões críticas para quem substitui McCarthy é se essa pessoa tem mais credibilidade em todo o partido, e portanto, enfrenta menos risco de ser vulnerável a um desafio semelhante. O jogo não está favorável aos republicanos. E para os democratas? Os democratas estão sentadinhos e relaxados, a deixar as divisões republicanas à mostra para que todos vejam. É um cenário estranho na Câmara dos Representantes quando se vê os republicanos a lutar entre si e os democratas a olhar, e à medida que avançamos para um ano eleitoral, isso não é algo que deixa os democratas muito preocupados.