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O problema do ativismo climático e a sua recente acentuação em Portugal

Óleo e gás. Protestos. Resistência civil? Crimes? Visibilidade. Sopa de tomate e … Ambiente??

Vivemos uma crise climática.Biliões de toneladas de dióxido de carbono são diariamente expelidos para a atmosfera, sem sinais de abrandamento. O ser humano produz hoje mais gases de efeito estufa do que nunca. Camadas de gelo e glaciares estão a derreter causando a subida do nível do mar e, com 40% da população mundial a viver a menos de 100 quilómetros da costa, a deslocação em massa poderá tornar-se uma realidade. Neste texto abordaremos as ações dos movimentos Just Stop Oil e Climáximo na sua “luta pelo clima”. O planeta não escolhe espectro político, é um problema global e que carece de resolução efetiva. Como direito humano, ousamos dizer que há que protestar para incentivar à ação. Parecendo contrariar o rumo desta reflexão afirmamos “Just Stop: Just Stop Oil”. Se a sua missão, a tentativa de que o governo britânico pare de garantir licenciamentos para a exploração de óleo e gás, tem um cariz nobre, a ação não prima pelo mesmo.

No passado dia 20 de Julho, um grupo de protestantes do Just Stop Oil (JSO) foi abordado e cercado por outro grupo, estes que vestiam t-shirts estampadas com: “Just stop pi**ing everyone off”; os ativistas clamavam “we know that disruption is uncomfortable but it is necessary” e “we have a sense of urgency (…) when you see a house on fire you’re not gonna ask permission to the people inside to do a fire rescue, you’re just going to do it”. Assim, mesmo concordando com estas afirmações, questionamo-nos sobre os seus métodos. Parar o trânsito, largar pó em eventos desportivos, colar as suas mãos a obras de arte, entre outros atos de vandalismo e, por fim e de certo modo suficiente, a última gota no copo de água, a sopa de tomate no National Gallery ainda em 2022. Entre Abril e Julho do mesmo ano, as ações dos ativistas custaram à polícia metropolitana britânica aproximadamente 7.7 milhões de libras que, por exemplo, poderiam ter sido canalizadas pelo governo para segurança ambiental, investidas em energias renováveis, entre outros.

No mesmo ano, diversos protestos surgem pela capital portuguesa, com escolas como a António Arroio e o Liceu Camões fechadas a cadeado, e imagens de jovens arrastados pelas forças de segurança correndo pelos meios de comunicação. Nas ruas, os manifestantes marcharam sobre as grandes avenidas em direção ao edifício da Ordem dos Contabilistas, edifício esse que invadiram em busca do Ministro da Economia e do Mar. A sua exigência era clara: a demissão do Ministro António Costa Silva, devido ao seu percurso profissional ligado à indústria petrolífera. Após dias de revolta, Costa Silva concedeu uma audição aos ativistas, mas, como referido pelo próprio, os mesmos não apresentaram qualquer proposta para alcançar os objetivos que propunham: o termo da utilização de combustíveis fósseis. O ativismo inspirado na JSO foi-se espalhando e inunda mais uma vez as nossas fronteiras, ganha então notoriedade a Climáximo fundada em 2016. Apesar de algumas motivações semelhantes, esta nova associação não faz parte da A22 (associação de movimentos climáticos já presente em 11 países à qual a JSO pertence).

Numa questão de dias, as ações dos ativistas da Climáximo tornaram-se um dos temas principais da discussão pública portuguesa. A sua primeira vítima foi o Ministro do Ambiente, Duarte Cordeiro, que em plena conferência de imprensa foi atacado por três jovens com balões de tinta verde, algo que em democracia não deve ser aceite. Concordemos ou não com o partido do Ministro, ele representa a sociedade portuguesa. Para a ocasião fica o caricato momento em que Duarte Cordeiro, atrapalhado, pede desculpa aos ativistas, sem se aperceber da sua intenção. Tal reação prova algo muito simples, a realidade portuguesa não está habituada ao radicalismo, o povo português tem fama de ser brando para com a classe política, mas isso aparenta estar a mudar. Algo semelhante aconteceu recentemente numa convenção na FIL, onde cinco jovens pintaram a fachada principal em protesto contra a indústria da aviação. Tudo culminou, no dia 3 de outubro, quando os ativistas da Climáximo, à moda JSO, formando uma corrente humana, bloquearam a estrada da 2ª Circular, via fundamental para uma grande parte dos lisboetas se deslocarem ao local de trabalho. Não acabou bem, em questão de minutos e “à portuguesa”, os condutores abandonaram as viaturas em direção aos manifestantes, arrastando-os para a beira da estrada, antes mesmo de chegarem as autoridades.

Esta misteriosa organização de repentina relevância suscitou um conjunto de questões: Quem são estas pessoas? O que defendem? De modo a responder a estas dúvidas fomos levados a investigar o site oficial da Climáximo. Instantaneamente, surge uma frase impactante: “O governo e as empresas declaram guerra às pessoas e ao planeta.”, traduzindo perfeitamente o sentimento sobre o qual os seus membros operam. Alguém que observa as alterações climáticas como uma “Guerra” promovida pelo Governo e pelas Empresas contra a população, não apenas nacional mas mundial, poderá estar disposto a toda e qualquer ação para combater os seus protagonistas. A Climáximo também se intitula como uma organização anti-capitalista e defensora do direito à habitação. Apesar da Climáximo ter alterado alguma da informação disposta no seu website quando criticada relativamente a estes temas, não nos parece que estas matérias, habitação ou a defesa do ambiente, sejam uma causa exclusiva anti-capitalista. Não podemos permitir a tentativa de apropriação destes tópicos como bandeiras de determinados grupos, estes devem ser transversais a toda a sociedade no interesse da humanidade. A defesa destes ideais faz-nos crer que este grupo não se trata apenas de um conjunto de ativistas, cujo interesse é única e exclusivamente defender e salvar o meio ambiente. Subjacente à sua principal bandeira têm por base movimentos ideológicos marxistas/socialistas, sobre como deve ser a sociedade e o mundo que vão muito além de um genuíno interesse de defesa do meio ambiente.

O problema não está no modelo capitalista, mas sim na forma como este é aplicado. Prova disso mesmo é a China, que sendo um estado comunista cujo modelo económico de capitalismo de estado desvirtua a causa do ambiente, torna-se o país mais poluente do mundo sem quaisquer sinais de diminuição das suas emissões de carbono. A questão climática é uma preocupação exclusiva de quem possui estabilidade económico-social. Para aqueles que vivem numa condição desfavorável, a sustentabilidade e a defesa do meio ambiente, mesmo que os afetem diretamente, não vão constituir uma preocupação primária, preferem garantir a sua própria segurança e estabilidade. Como na perspectiva comunista de distribuição de riqueza, defendida pelo estado chinês, não se revela um modelo económico e social que assegure as condições de vida necessárias, a sociedade não tem como preocupação o ambiente. Quando se atinge este equilíbrio na sociedade, a preocupação do cidadão passa a abranger temas como o outro ou o próprio planeta, aí o modelo capitalista é forçado a adaptar-se a estas novas prioridades da população. Como a finalidade deste modelo é gerar capital e este só se obtém agindo em conformidade com a necessidade do mercado, se esta necessidade corresponder ao ambiente, acaba por surgir o capitalismo verde. Sozinho e sem custos o capitalismo não vai salvar o planeta.

A crise climática existe nas mãos de burocratas, e infelizmente, por detrás de uma cortina de papelocracia, as próprias soluções que aparecem e se apresentam em vez de serem acessíveis tornam-se cada vez mais distantes para os consumidores. Se a sociedade quisesse de facto combater a crise climática, existiriam custos, e o primeiro seria deixar de olhar a luta climática com fins lucrativos. As dúvidas quanto a este tipo de movimentos continuam, pois não aparentam apresentar uma solução prática e flexível, que tenha em conta a complexidade que o problema exige. Os seus objetivos não têm em consideração outras formas de resolver a questão, como uma melhor eficiência energética nos transportes, indústrias e edifícios. Não medem o impacto que os combustíveis fósseis ainda têm na economia nacional e internacional, ou a consequente dependência que as pessoas têm dos mesmos para fazer a sua vida, em alguns casos até sobreviver.

A solução passa pelo progressivo abandono dos combustíveis fósseis, porém, não de uma forma imediata mas sim garantindo uma transição energética sustentável a nível social e económico. Passa também por um maior envolvimento e investimento na ciência que faz de facto progressos, embora muitas vezes esquecidos no tempo. Recordemos que, por exemplo, em 2021 um cientista sérvio, Dr. Ivan Spasojevic, juntou o conceito de microalgas ao conceito de um banco de rua (adaptável a outras formas) e desenvolveu com um custo adequado e com materiais reutilizáveis da indústria agrícola e florestal, o “Liquid 3”, com o intuito de ser lido como “Árvore Líquida”. Bancos de rua que absorvem dióxido de carbono da atmosfera, cada banco correspondente a uma eficiência cinquenta vezes superior à de duas árvores adultas, não com o objetivo de substituir árvores mas de reduzir a pegada carbónica das cidades, que estima-se produzirem 75% das emissões globais. Este projeto foi implementado em Belgrado e caminha para Nova Iorque e Paris vencedor de 1 de 11 prémios do UNDP (United Nations Development Programme). Assim como este, muitos outros projetos, atuais e futuros, podem implementar discretamente na sociedade a luta pelo ambiente.

Hoje, visto que vivemos na era do reacionário e do agir no momento,muitas vezes sem pensar nas consequências de nos sentarmos na estrada, ou no que realmente queremos obter com as nossas ações, mesmo que seja só visibilidade, o dilema climático, ainda que seja de necessária resolução, não pode cair num discurso fundamentalista reacionário. Deste modo retiramos a parte boa das ações destas organizações: a discussão política, o colocar na agenda, o falar e discutir posicionando-nos do lado de lá da barricada do radicalismo como defensores do ambiente e, assim, questionando-nos acerca da utilização destes métodos que descredibilizam a causa, retomamos o início desta dissertação: “Óleo e gás. Protestos. Resistência civil? Crimes? Visibilidade. Sopa de tomate e … Ambiente??”