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A “aliança” conhecida como BRICS acabou de crescer. Na cimeira anual dos BRICS em Joanesburgo, o Presidente da África do Sul anunciou que 6 novos países se iriam juntar à aliança. A China, que se tem tornado na força motora do grupo, tem razões para estar contente. Xi Jinping demonstrou-se bastante agradado com esta expansão, mencionando que este era um “novo capítulo de solidariedade e cooperação”.

Os BRICS sempre foram uma mistura muito peculiar, sendo originalmente vistos como os países em desenvolvimento que futuramente iriam deter grandes fatias da economia mundial. Muitos outros países quiseram o prestígio e poder de negociação que a pertença a este grupo lhes oferece, mas o que move estes novos países a juntarem-se aos BRICS vai muito para além dos benefícios económicos.

O encontro em Joanesburgo foi um símbolo de como a geopolítica está a mudar. O grupo convidou 6 novos membros, demonstrando como as potências emergentes se estão a tornar mais assertivas no panorama internacional, e como a China se está a tornar mais assertiva em agarrar nessas potências.

O bloco teve bastante reconhecimento nos anos 2000 quando havia muito otimismo em relação ao crescimento dos mercados emergentes no geral, mas, apesar disso, na década de 2010 a opinião da maioria dos analistas era que os BRICS estavam numa fase decadente e perto do fim. As economias não-asiáticas quase não cresciam economicamente e era difícil encontrar qualquer relevância neste bloco. O grupo, sendo abstante diversificado, mais rapidamente discordava em assuntos de política global do que concordava em praticamente qualquer assunto.

Continuou a reunir-se todos os anos e foi de certa forma uma plataforma para criticar a ordem internacional liderada pelo Ocidente. No entanto, ninguém levou esta iniciativa (ou o grupo) muito a sério. Aliás, muito francamente, acho que nem os próprios BRICS se levavam a sério.

Tudo começou a mudar há alguns anos, o Ocidente tornou-se mais conflituoso em relação à China, mas a agravante maior foi a invasão russa da Ucrânia. Durante este último ano temos assistido à China (com a Rússia a reboque) a utilizar os BRICS como um contrapeso institucional ao Ocidente, e em particular, ao G7.

Ao mesmo tempo, isto não tem sido uma tendência impulsionado só pela parte dos BRICS. Tem sido uma resposta à procura global transitória que está a acontecer: Hoje temos potências médias muito mais assertivas à medida que estas ficam mais ricas e querem desempenhar um papel mais importante nos assuntos globais. Por esta razão é que mais de 40 países manifestaram interesse em aderir aos BRICS antes da sua cimeira em Joanesburgo, e cerca de metade deles já tinham apresentado formalmente as suas candidaturas.

Portanto, o processo de expansão foi algo impulsionado principalmente pela China e pela Rússia sim, mas também era uma resposta a uma tendência na geopolítica que se está a verificar como real, que é um grupo de “middle powers” mais assertivas do que antes a tentar criar espaço entre o Ocidente e uma ordem mundial liderada pela China, para tirar mais proveito do sistema internacional. Não sei como irão fazer um novo acrónimo com isto, mas os novos países são: Argentina, Etiópia, Egito, Irão, Arábia Saudita e os Emiratos Árabes Unidos.

É difícil não olhar para este grupo de países e não ver a influência da China aqui estampada. para os países do Golfo em particular, a sua adesão aos BRICS enquadra-se tanto no seu desejo de recalibrar a sua relação entre o Ocidente e a China, como também no recente impulso da China para uma diplomacia mais concertada na região. o desejo dos BRICS de ver mais comércio feito em moedas que não o dólar também se enquadra aqui, porque se puderem comprar mais produtos eles com a sua própria moeda isso irá enfraquecer o domínio do dólar.

Os outros três, Egito, Argentina e Etiópia, são países grandes na sua região, mas a razão da sua entrada no grupo parece ter mais a ver com a sua proximidade com a China nos últimos anos. Vejamos o caso da Etiópia, o segundo país mais populoso do seu continente, tem um PIB per capita inferior a mil dólares, portanto não é uma grande “middle power” óbvia, para além de que teve uma enorme guerra civil que ainda está em curso. Poderíamos apontar outros nomes que seriam membros africanos mais óbvios dos BRICS (como a Nigéria ou o Quénia), mas devido aos seus laços de longa data com a China, a Etiópia foi o primeiro da fila. O grupo está a ficar muito variado. Economicamente, os BRICS já diferem muito em termos de PIB per capita, políticas monetárias e limites comerciais, e isso vai tornar-se ainda mais notório à medida que acrescentam mais 6 membros, São também muito diferentes politicamente: dos membros existentes, temos 3 (mais ou menos, bastante imperfeitas) democracias e 2 autocracias. Na cimeira, foi bastante perceptível o quão politicamente diferentes são. As 3 democracias não estavam (pelo menos explicitamente) a declarar o quão mau eles sentiam que a ordem internacional do Ocidente era, de um modo geral tratava-se apenas de apelos ao desenvolvimento mútuo, à cooperação e à multipolaridade. Entram os discursos de Xi Jinping e Vladimir Putin e os seus tons eram muito mais duros, às vezes roçando um discurso de quase catástrofe da situação mundial, e apresentavam-se mais como um desafio direto ao Ocidente. Esta é uma tensão que eles vão ter de gerir daqui pra frente: teremos um grupo de países que vêem os BRICS como parte duma estratégia genuína de não-alinhamento e teremos as 2 autocracias mais poderosas do mundo, lideradas pela China, que encaram o grupo como uma maneira de desafiar diretamente o Ocidente. A cimeira demonstrou que o Ocidente não pode ignorar os BRICS, que tem agora 11 membros e promete fortalecer as suas instituições independentes como o New Development Bank, e o grupo é claramente apelativo a muitos destes middle powers que estão a tentar encontrar o seu caminho num mundo onde há tensões crescentes entre o Ocidente e a China. Irá haver uma tensão fundamental entre os middle powers que estão genuinamente não alinhadas (Índia, Brasil, Emirados Árabes Unidos e a Árabia Saudita) e as duas autocracias que vêem os BRICS como um motor para colocar mais países na sua esfera de influências. Penso que isso significa que quando houver questões em que possam alinhar numa crítica comum ao Ocidente, podem ter um alcance e uma voz poderosa, mas será, na maior parte, limitado pelas suas próprias contradições e divisões.