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Casos como o ocorrido recentemente no centro Ismaili em Lisboa chocaram os moradores causando medo e indignação. Orgulhosos de serem considerados, por dois anos seguidos, em 2019 e 2020, o 3º país mais pacífico do mundo, segundo o Global Peace Index (Índice Global da Paz).

Lisboa tem sido centro das atenções no contexto internacional e cobiçada pela qualidade de vida e estabilidade que promove. Entretanto, com a entrada massiva de estrangeiros de diversas origens e aumento da desigualdade entre os habitantes devido às crises derivadas da pandemia do Covid-19, nos últimos anos, as desigualdades têm tomado proporções aquém das capacidades governamentais, que lutam diariamente para manter a ordem e velocidade adequada de meros serviços consulares, condições favoráveis e dignas de habitação e trabalho, assim como do fluxo e da regulamentação dos imigrantes dentro do país.

Neste contexto, bem menos estável e no qual as pessoas que vieram em busca de melhores condições de vida estão vivendo, a culpa de incidentes como o assassinato de Mariana Jadaugy e Farana Sadrudin é de quem?

Ainda não se sabem as motivações para tais atos violentos. O agressor afegão, Abdul Bashir, de 29 anos, além de possuir problemas psicológicos, muito devido ao seu passado conturbado, é também beneficiário de um estatuto de proteção internacional acordado entre o Ministério da Administração Interna e o Ministério da Migração Grego, em Outubro de 2021. Portanto, pode-se induzir, que tais desavenças pessoais, às quais as autoridades têm designado como precursoras do crime, não são, de todo, os únicos motivadores deste crime.

O legado histórico, a polarização política, a influência da mídia, a falta de conhecimento, a ansiedade económica, bem como o medo do terrorismo e as tensões sociais e culturais também gerados pelos fatores anteriormente citados são, para além do agressor, igualmente responsáveis. No entanto, a única preocupação clara, representada pelo primeiro-ministro de Portugal, António Costa, ao dizer que “ainda não se sabe se o ataque foi um atentado terrorista (…) mas tudo aponta para um ato isolado”, logo após o incidente, é de que a fatalidade não possui envolvimento com grupos terroristas, sendo esta a primeira conclusão que desinformados e políticos de extrema-direita utilizarão para criar narrativas negativistas em relação aos imigrantes no país e utilizar este raciocínio para convencer mais pessoas a fim de diminuir o apoio governamental à estabilização permanente dos imigrantes em território nacional.

Com uma clara debilidade de informações factuais e aprofundamento intelectual acerca do assunto, os mídia parecem evitar tópicos relacionados às melhorias que o governo também deveria buscar para fazer juz às altas colocações relacionadas à segurança no contexto internacional, salvo fontes como o “Setenta e Quatro” - projeto de informação digital que atua na garantia dos valores democráticos e progressistas - que repudia métodos de jornalismo descritivos, muito utilizados por fontes pouco credíveis ou interessadas em abordar os fatos de maneira mais crítica.

Assim, o primeiro passo, antes de qualquer proposta e implementação de melhorias políticas, é priorizar a melhora dos canais de informação. A melhoria considerável na atual falta de conhecimento da população através dos meios de comunicação idealmente resultará em um aumento no interesse e na participação dos cidadãos em temas políticos importantes, pois como bem identificado por Yiossuf Admangy - “Ainda há muitos ignorantes e a prova disso é quando olham para os muçulmanos como imigrantes, quando na realidade, a maior parte são portugueses oriundos de ex-colónias de Portugal”. Tal como faz a própria DDEP (“Da Democracia Em Portugal”), investigar e expor novos pontos de vista e trazer à superfície fatores que contribuirão para uma discussão embasada em fatos concretos é essencial para que a implementação de políticas públicas liberalistas tenham uma implementação bem-sucedida.

Em uma segunda análise, o legado histórico de culturas islâmicas, que enfrenta diariamente uma opinião pública influenciada por canais de informação, muitas vezes comprometidos pelos partidos extremistas que os controlam para que políticas segregacionistas que “propõe medidas como o encerramento de espaços de culto que promovam “condutas não compatíveis com a cultura e a identidade ocidental” ou que “incentivem o terrorismo”, assim como a proibição de erigir mesquitas “promovidas pelo Wahabismo, Salafismo ou qualquer interpretação fundamentalista do Islão” e a proibição do financiamento externo de lugares de culto” sejam objetivos políticos alcançáveis.

A polarização política teve início “com a fundação do partido Chega em abril de 2019, André Ventura veio normalizar discursos racistas que, embora muito presentes de forma mais ou menos latente na sociedade portuguesa, passam a encontrar maior espaço de legitimação e empoderamento.”

A influência negativa da mídia sobre esta cultura, dado que, “salvo raras excepções, como a detenção de um radical islâmico no Porto em 2007, a comunidade islâmica em Portugal raramente aparece nas páginas dos jornais”, e a ansiedade económica da população conduz os medos de terrorismo e afetam diretamente o processo de polarização política, uma vez que os partidos, principalmente, os de extrema-direita, utilizam a mídia de maneira tendenciosa a fim de influenciar o público a ter opiniões e comporamentos favoráveis às suas crenças xenófobas e segregacionistas.

Certamente, não se pode dizer, que estes fatores são os únicos motivos do homicídio. Como dito anteriormente, as informações acerca do caso não foram devidamente apuradas e apontam ainda para diversas motivações, desde coerção até distúrbios comportamentais. No entanto, é interessante notar a forte necessidade de reestruturação do sistema político e midiático, que o ocorrido traz à tona, para que nos conscientizemos de que situações como estas não devem ser normalizadas ou reforçadas de maneira inconsequente. Apenas quando princípios de liberdade e igualdade de expressão forem internalizados pela sociedade é que será possível alcançar a verdadeira segurança, socialmente igualitária.

“O momento é de pesar e solidariedade com as vítimas deste ataque hediondo”, lê-se no voto aprovado por unanimidade na reunião pública da câmara e subscrito por todos os vereadores do executivo municipal, nomeadamente a liderança PSD/CDS-PP, PS, PCP, BE, Livre e Cidadãos Por Lisboa (eleitos pela coligação PS/Livre).