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A Educação é dos setores mais importantes do Estado e é o ponto de partida para a formação das próximas gerações. Seria de esperar que todos os países, incluindo o nosso, estivessem envolvidos no trabalho de melhorar as condições da educação, no entanto, nem sempre é o que se verifica. Quando se fala da Educação, existe um grupo de pessoas cuja referência é obrigatória, e cujo papel para o setor é vital: os professores. Observando as notícias mais recentes, é possível reparar na elevada mobilização dos professores e ouvir inúmeros comentários sobre a chamada “luta dos professores”.

Apesar de não ser professor, tenho um grande número de professores na família e, como tal, a luta dos professores não é apenas algo que ouvi nas notícias, mas que vivencio diariamente.


Mas o que é a luta dos professores? Existem vários problemas, mas destacam-se quatro grandes grupos: o congelamento das carreiras, as quotas, as questões da colocação dos professores e ainda a falta de professores.

Para começar com a questão das quotas, é importante explicar que a carreira dos professores funciona por um conjunto de escalões, neste caso dez. Existem vários fatores que dependem de cada escalão, mas os dois mais importantes são o tempo de serviço e a respetiva remuneração, sendo que quanto mais próximo do “10” o docente estiver, maior será a sua remuneração. São necessários quatro anos para um docente subir de escalão, com exceção dos 5o e 7o escalões cujo tempo é de apenas 2 anos. Associado a esta situação, a evolução dos escalões depende também de vagas, ou seja, não basta o docente cumprir todos os anos acima mencionados, tem também de se inserir no número de vagas.

A avaliação dos professores é feita no fim de cada escalão. No 5o e 7o escalão, quem obtém a menção de “Muito Bom” ou “Excelente” não está sujeito à existência de vagas para o acesso, no entanto, devido às quotas na avaliação do docente, apesar de requererem a condição para obter Excelente e Muito Bom, vêm a sua avaliação a ser reduzida a um Bom “administrativo”, o que significa o não reconhecimento do seu trabalho, necessitando entrar pelo método das vagas para entrada no escalão, vagas essas determinadas todos os anos pelo Ministério da Educação. Quando as vagas deste último esgotam, os que não conseguiram entrar ficam impossibilitados de subir de escalão. Este sistema é a grande luta dos professores pois é considerado, e bem, como um sistema injusto que impede os professores de ter a devida remuneração adequada ao seu tempo de trabalho. Para mais, por causa da crise, em 2011 foi decretado o impedimento de subida no escalão, apesar de ter havido um pequeno descongelamento. Este descongelamento mantém-se até hoje e, apesar de já terem sido descongelados três anos, o Estado ainda deve 6 anos, 6 meses e 23 dias aos professores que deviam ter subido de escalão e não o puderam fazer.


A colocação dos professores é outra questão pertinente por dois motivos. Por um lado, o Estado precisava de professores e precisava nas zonas mais urbanas com especial relevância para distritos como os de Lisboa. Por outro lado, por se recusar a integrar os professores de quadros, recorria aos professores contratados para os colocar fora da sua área de residência por razões puramente economicistas. O economicismo tinha apenas um motivo: o salário que o Estado pagava a um professor contratado era menor que o salário de um professor do quadro. Por este motivo, era mais vantajoso para o Estado só recrutar professores contratados.

Porém, a Comissão Europeia, ao verificar esta situação, percebeu que Portugal estava a incorrer na violação dos direitos da proporcionalidade e da igualdade e, com esta conclusão, ameaçou o Estado Português que ou corrigiria a situação e dava salários iguais a todos os professores independentemente do vínculo profissional, ou então iria enfrentar um processo judicial no Tribunal de Justiça da União Europeia. Com esta ameaça feita em julho de 2022, o Estado abandonou esta ideia e, em vez de proceder às devidas correções salariais, tentou contornar com uma proposta de educação.

Com estas questões, chegamos ao resultado que também é um problema: as mudanças anuais. As colocações longe das áreas de residência dos docentes e a questão das quotas faz com que não haja professoras nem quem o queira ser. Analisando os dados estatísticos que nos são dados pelos vários órgãos governamentais, é possível perceber que depois do Boom do número de professores que se evidenciou nos anos 80, não só se vê que não há muitas pessoas depois dessa época a tornarem- se professores, mas também que os que se tornam não são suficientes para compensar esses que entraram nos anos 80 e que começam a chegar ao merecido tempo de reforma.

Sobre o recrutamento dos professores, ainda é possível recrutar professores para os 1º e 2º ciclos mas depois é muito difícil recrutar professores de 3~ ciclo e secundário porque apesar de haver muitas pessoas com licenciatura numa determinada área, não há quem queira tirar um mestrado em ensino. Sendo este mestrado um requisito obrigatório para a entrada na carreira da educação, é difícil encontrar pessoas que queiram lecionar nestes ciclos.


Para terminar, importa também falar do estado da Educação em Portugal. Não obstante a questão dos professores, observa-se que as escolas estão a perder a sua dimensão certificadora no sentido em que existe cada vez uma maior pressão para os alunos passarem de ano mesmo que não cumpram todas as exigências. Para além disso, e como agravante, começa a haver um facilitismo por parte do Ministério da Educação no que toca à formação dos alunos, que deixa de estar preocupado com o verdadeiro conhecimento dos alunos e admite a possibilidade de qualquer aluno passar de ano sem ter o devido teste que o certifique, neste caso, os exames nacionais.

Tudo isto é algo que tem de ser resolvido pelo governo o mais rapidamente possível, mas infelizmente isso não se está a verificar. Se por um lado temos um governo que tenta iludir os professores com boas intenções e boas mensagens na comunicação social, temos também um governo que pouco se preocupa com os professores que trabalham em zonas como Lisboa onde o salário dos mesmos não lhes permite arranjar uma casa a preços acessíveis.

Temos também um governo que diz que é direito dos professores terem um maior reconhecimento mas no momento em que é chamado a dar esse reconhecimento aos professores com o descongelamento das carreiras, opta sempre por recusar e chega a ameaçar com a demissão. A educação não é necessariamente uma despesa, é um investimento nas futuras gerações e criar situações que não só incitam os professores a abandonar as profissões como também não encoraja os alunos a seguirem esta carreira torna-se algo perigoso uma vez que a solução para a resolução do problema poderá passar, ainda que nem devia ser uma opção, pela imigração. Naturalmente, os professores não desejam isto, e têm vindo a aumentar a contestação nas ruas e no trabalho por meio de greves e manifestações. Numa classe profissional com cerca de 160 mil professores distribuídos a nível nacional, é possível avaliar o grau de insatisfação pelo número de professores por manifestação.


Em 2008, numa manifestação em que eu participei, mais de 120 mil professores saíram às ruas de Lisboa para protestar. Este ano, em 2022, novamente numa manifestação em que participei, foram mais de 150 mil. Num setor tão importante para o país, não há palavras para descrever a falta de consideração do Governo nesta questão. Mas, por outro lado, para descrever a imensa coragem com que os professores se mobilizam para os protestos, protestos esses que não só representam uma luta por algo que é deles mas também por um imenso gosto ao ensino e uma devoção e entrega ao país pela preparação daqueles que são o presente e serão o futuro.